O Plenário transferiu para terça-feira (13) a votação do Projeto de Lei do Senado (PLS) 204/2016, que permite à administração pública “vender” para o setor privado os direitos sobre créditos tributários e não tributários. A permissão vale para todos os entes da federação e visa um reforço emergencial no caixa da União, dos estados e dos municípios.
A cessão se dá por meio de securitização, que começa com a transferência dos créditos com parcelamento administrativo ou judicial, inscritos ou não na dívida ativa, para uma sociedade de propósito específico (SPE). Essa sociedade faz “pacotes” desses créditos e os converte em títulos ou debêntures padronizados negociáveis no mercado de capitais.
O dinheiro captado no mercado com a venda dos títulos, geralmente com remuneração acima do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), retorna ao ente detentor originário dos créditos. Na prática, com a “venda” desses títulos ou debêntures, os entes da federação poderão antecipar o recebimento desses créditos.
De acordo com a proposta, a venda não pode alterar as condições de pagamento já estabelecidas para o crédito, nem transferir para o setor privado a prerrogativa de cobrança judicial – que deve permanecer com o poder público. A operação não pode acarretar nenhum compromisso financeiro para a administração pública, como a eventual responsabilização pelo pagamento futuro, no caso de inadimplência do devedor.
Aplicação
Relator do projeto em substituição à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), o senador Paulo Bauer (PSDB-SC) aceitou sugestões dos senadores Flexa Ribeiro (PSDB-PA) e José Aníbal (PSDB-SP) para fixar em 50% a aplicação mínima do dinheiro da venda desses ativos no pagamento da dívida pública ou no aporte em fundos de previdência dos regimes próprios de cada ente federado. Os 50% restantes devem ser destinados a investimentos.
Autor do projeto, o senador licenciado José Serra, argumenta que a cessão de direitos creditórios para pessoas jurídicas privadas já é praticada por algumas administrações e garantida por legislações estaduais e municipais, mas aponta a necessidade de maior segurança jurídica. Crítico do projeto, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) afirmou que a proposta visa, na verdade, legalizar operações já realizadas por alguns estados e municípios.
Polêmica
A proposta gerou muita polêmica na sessão do Plenário nesta quinta-feira (8). O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) não concordou com o voto de Bauer contra emenda de sua autoria que restringia a cessão de direitos de créditos aos recebíveis compreendidos no exercício do mandato do chefe do Poder Executivo cedente. Caiado disse que seu objetivo é evitar a antecipação de recebíveis de “forma predatória”, o que prejudicaria mandatos posteriores.
O senador Romero Jucá (PMDB-RR) manifestou-se a favor da proposta, mas defendeu um controle para evitar “o que aconteceu no passado com a questão dos precatórios”. Segundo ele, foram “fabricadas” dívidas, vendidas e revendidas no mercado, irregularidade que foi apurada pela CPI dos Precatórios, instalada pelo Senado em 1997.
Antecipação
Além de Requião, Gleisi Hoffmann (PT-PR), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Lindbergh Farias (PT-RJ) alertaram para uma possível violação da Lei de Responsabilidade Fiscal, por entenderem que se trata de uma operação de antecipação de receitas.
Após ouvir um apelo do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) em favor do projeto, para ajudar o Rio de Janeiro a superar as dificuldades financeiras, Vanessa disse que, se depender desse projeto, o estado “não vai sair da crise”, porque “já torrou todos os recursos futuros dos royalties do petróleo”.
Em defesa da tese de que se trata de antecipação de receitas, Lindbergh recorreu a um artigo do procurador Júlio Marcelo de Oliveira, que denunciou as pedaladas da ex-presidente Dilma Rousseff. Segundo Júlio Marcelo, “arrumaram um subterfúgio ilegal com aparência legal para antecipação de receita e burlar a Lei de Responsabilidade Fiscal”.
Deságio
Requião protestou com o não acolhimento de duas emendas de sua autoria, com o objetivo de limitar o deságio na venda desses créditos e destinar os recursos captados para investimento. O senador não quer que o deságio ultrapasse 3% a taxa Selic.
– Eu estabeleci, na minha emenda, que os recursos fossem utilizados para investimento, para mexer na base da economia. Mas, não, os recursos são destinados à banca, ao pagamento da dívida, ao cumprimento dos juros absurdos, estabelecidos pela banca que domina o Banco Central, que são os mais altos do planeta Terra – protestou Requião.
Gleisi lamentou que todas as matérias em debate na sessão destinem-se a pagar despesas financeiras – estava em pauta, também, a discussão em segundo turno da PEC do Teto dos Gastos. Para ela, “não são matérias para pagar programas sociais, para reativar a economia, para melhorar a situação do povo brasileiro”.
Da Redação
Fonte: Agência Senado – 08/12/2016.