Mais da metade dos contribuintes conseguiu decisões favoráveis, ou parcialmente favoráveis (55,6%), em casos levados ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) em 2014, aponta estudo da Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ).

O temor dos advogados é que o quadro mude. Depois que a Polícia Federal anunciou em março a Operação Zelotes, que investiga a compra de votos no Carf, o Ministério da Fazenda iniciou uma reforma do tribunal do fisco.

Com isso, o equilíbrio nas decisões fica em xeque. Segundo o levantamento da ABJ, os resultados só favorecem a Receita Federal em 44,4% das discussões.

Uma das alterações feitas pela Fazenda é que os representantes dos contribuintes não podem mais exercer a advocacia durante seus mandatos de conselheiros. Com isso, 90 deles (eram 108) pediram dispensa.

Para o representante da ABJ, Pedro Miranda Roquim, o equilíbrio nas decisões é indício de que o Carf funciona de forma adequada. Ele cita como critério a hipótese de Priest-Klein. “Esta tese [Priest-Klein] diz que uma pessoa só busca um tribunal se tem uma dúvida razoável sobre a causa. Isso gera uma tendência de resultados de 50% a 50%”, diz.

Roquim, crítico das mudanças, entende que a unanimidade nas decisões é outra prova de que o Carf produzia decisões técnicas. Um dos mitos do tribunal é que os conselheiros votam de acordo com a ideologia: fiscais sempre a favor da Fazenda e advogados, pelo contribuinte.

Mas segundo o estudo, em 733 dos 877 acórdãos (83,6% dos casos) a decisão foi unânime. Os casos foram decididos pela maioria dos votos em 144 acórdãos (16,4%). “Isso prova que tanto os conselheiros do fisco quanto os dos contribuintes aplicam a norma de forma coerente”, diz Roquim.

O ex-conselheiro do Carf e sócio do escritório Andrade Maia, Fabio Brun Goldschmidt, entende da mesma forma. “Os números mostram que as decisões são balizadas acima de tudo pelo direito e pela correta aplicação das normas, enquanto as ideologias são colocadas de lado.”

Relatoria

O estudo da ABJ indicou que a relatoria do caso traz pouco impacto no resultado do julgamento. Se o relator (quem estuda o caso a fundo) do processo era um fiscal, o contribuinte obteve decisão favorável em 32,5% dos casos e parcialmente favorável em 20,7% dos casos. Se o relator era contribuinte, as taxas ficam em 35,5% e 17,7%.

“Essa estatística mostra que o tribunal agia de maneira ponderada; que as turmas formavam consenso sobre a matéria e então seguiam uma orientação, sem reabrir o debate sempre que um novo caso aparecia”, diz Goldschmidt.

Ele explica que apesar de todos os membros do colegiado terem acesso ao processo, o relator assume um papel importante. E como os processos muitas vezes têm milhares de páginas, nem sempre é possível checar os detalhes de cada premissa usada pelo relator. “Quer dizer, o relator pode sim induzir os demais”, comenta.

Porte

Roquim aponta que uma das vantagens do Carf é que a empresa pode questionar um auto de infração lavrado incorretamente com um custo muito menor do que no Judiciário. Na Justiça, é preciso oferecer quantia em dinheiro, imóvel ou outra garantia da dívida para poder questionar o fisco.

“O Judiciário traz uma série de despesas que o pequeno não consegue suportar. No âmbito administrativo, o próprio empresário ou o contador pode preparar a defesa, até sem o advogado”, afirma. Nesse sentido, o conselho seria uma ferramenta para contrabalancear a “sede arrecadatória” do governo, diz Roquim.

O estudo da ABJ, contudo, mostra que as empresas de menor porte são as que menos ganham no Carf. Enquanto as empresas limitadas conseguiram decisão totalmente favorável em 31,8% dos casos, as sociedades anônimas (S/A) ganham em 43,1% das ações.

Para Roquim, as grandes empresas têm mais estrutura para lidar com a papelada. “Já a pequena não tem um departamento de contabilidade, não consegue saber se preencheu errado um documento. É um País muito burocrático.”

Fonte: DCI – LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS – Roberto Dumke – 01/09/2015.

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