A Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) adiou para janeiro a discussão de um dos temas mais aguardados pelos tributaristas: o aproveitamento de ágio. Os julgamentos de cinco casos que estavam na pauta da 1ª Turma foram suspensos por pedidos de vista e, de acordo com o novo regimento do órgão, devem ser retomados na próxima sessão. Um deles é o primeiro envolvendo uma privatização a chegar à última instância do Carf.

Em todos os casos, a questão foi levada à Câmara Superior por meio de recursos da Fazenda Nacional. O tema também tem grande relevância por causa do número de autuações e dos valores envolvidos, segundo o procurador chefe da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no Carf, Moisés de Sousa Carvalho Pereira.
O ágio é um valor pago, em geral, pela rentabilidade futura de empresa adquirida ou incorporada. Ele pode ser registrado como despesa no balanço e amortizado, reduzindo o valor do Imposto de Renda e CSLL a pagar. Apesar de a lei permitir a amortização, a Receita Federal costuma autuar contribuintes quando interpreta que uma operação entre empresas foi realizada apenas para a redução de tributos.
Poucos casos sobre ágio foram analisados pela Câmara Superior e pela Justiça. O presidente do Carf, Carlos Alberto Barreto, destacou que o tema é novo. “Nos próximos 45 dias é só isso que vão estudar aqui”, disse ontem Barreto durante o intervalo da sessão, fazendo referência aos pedidos de vista.
O Carf já julgou 228 processos sobre ágio, segundo Roberto Quiroga Mosquera, do Mattos Filho, que defende a Companhia Energética de Pernambuco (Celpe) no órgão. A empresa é parte no primeiro caso que discute ágio de uma privatização a ser julgado na última instância do Carf. Na sustentação oral, o advogado afirmou que entregou um material com os precedentes do órgão aos conselheiros.
Neste caso, a Fazenda Nacional alega que não há confusão patrimonial entre empresas, o que seria um dos requisitos para a amortização de ágio. Para Quiroga, porém, a operação realizada é a mesma de todas as privatizações feitas no Brasil, incluindo as 18 discutidas por turmas ordinárias do Carf. Destas, em 13 os contribuintes saíram vitoriosos.
O único voto proferido foi o do relator, conselheiro Rafael Vidal de Araujo, que acatou o pedido da Fazenda Nacional, restabelecendo a autuação fiscal. Após sua exposição, o julgamento foi suspenso por um pedido de vista coletivo.
Em outros casos, mesmo quando houve pedido de vista de apenas um conselheiro, decidiu pela conversão em coletivo. Com a manobra, pretendese acelerar os julgamentos. Pelo novo regimento do Carf, não haveria mais a possibilidade de uma nova interrupção. Esses processos terão que voltar à pauta em janeiro e ser julgados.
Um dos recursos é da Biosintética Farmacêutica, autuada em cerca de R$ 300 milhões. A operação analisada envolveu a Aché Laboratórios Farmacêuticos, que adquiriu todas as quotas sociais da Biosintética com ágio de R$ 437,5 milhões e as transferiu para a Delta Participações Farmacêuticas, que, posteriormente, foi incorporada pela Biosintética. Para a Fazenda, essa reorganização societária não teve propósito negocial, mas apenas para reduzir a carga tributária.
Em todos os casos, a Fazenda alega que não haveria previsão legal para transferência de ágio, segundo o procurador Marco Aurélio Zortea Marques, que fez defesa oral no caso da Biosintética. “A amortização de ágio não é um direito do contribuinte”, disse. “A legislação determina que deve haver confusão patrimonial entre empresa adquirida e adquirente.”
Ontem, foram realizados julgamentos até as 19h, pouco além do horário estabelecido para o término dos trabalhos. Até a hora limite (18h), os conselheiros analisaram processos com sustentações orais, para dispensar os advogados. No total, foram julgados vinte recursos.
As sessões de julgamento do órgão foram retomadas na segunda¬feira. Estavam suspensas desde março, quando foi deflagrada a Operação Zelotes, que investiga corrupção no conselho.
Por Beatriz Olivon | De Brasília

 

Fonte: Valor Econômico – 09/12/2015.

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