Uma liminar concedida pela Justiça Federal do Rio Grande do Sul permite que um empresário condenado em primeira instância por crime de evasão de divisas use os benefícios da Lei da Repatriação de Ativos- Lei nº 13.254. A norma possibilita que recursos alocados fora do país sejam regularizados com o pagamento de 15% de Imposto de Renda e multa de 15%. O programa deve garantir neste ano cerca de R$ 7 bilhões aos cofres públicos.

Ainda cabe recurso contra a liminar. Contudo, segundo o advogado Arthur Maria Ferreira Neto, do Ferreira Neto Advogados Associados, que representou o empresário no processo, a adesão ao Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT) será comunicada ao juízo responsável pelo processo penal para a extinção da punibilidade.
No caso, o empresário foi condenado porque remeteu ao exterior valores por meio de doleiro (dólar cabo). Mas pessoas condenadas por outros crimes listados na lei – sonegação fiscal, falsificação de documento público ou particular ou falsidade ideológica -, segundo advogados, poderiam seguir o mesmo caminho.
A liminar determina que a Receita Federal permita ao empresário preencher e enviar a sua Declaração de Regularização Cambial e Tributária (Dercat), independentemente da existência de sentença condenatória de primeiro grau (não transitada em julgado). Ela foi proferida pelo juiz Leandro da Silva Jacinto, da 13ª Vara Federal de Porto Alegre (RS).
Segundo o magistrado, a Instrução Normativa (IN) nº 1.627, editada pela Receita, extrapolou o seu poder regulamentar ao dispor que não poderá optar pelo RERCT o condenado em ação penal cujo objeto seja um dos crimes listados no parágrafo 1º do artigo 5º da Lei nº 13.254, deste ano, “ainda que não transitada em julgado”.
A IN, de 11 de março, regulamentou a repatriação. Porém, a norma ainda suscita inúmeras dúvidas dos interessados em aderir ao regime e já levou o Fisco a incluir, ao menos, 46 esclarecimentos sobre o assunto em seu site.
Aquele que vai aderir ao regime especial tem que marcar num campo da Dercat que não tem condenação judicial em matéria penal. Assim, quem já estiver sido condenado, mesmo sem o trânsito em julgado, correrá o risco de não conseguir a adesão. “E o mais grave é marcar que não é condenado e depois ser acusado por crime de falsidade ideológica”, afirma Ferreira Neto.
No mandado de segurança preventivo, o advogado argumentou que a Lei da Repatriação só foi regulamentada após a condenação do empresário. Alegou ainda que a restrição imposta viola o princípio da igualdade. E defendeu a aplicação do princípio da presunção de inocência por ainda caber recurso na esfera penal.
Segundo o advogado Leonel Annes Keunecke, do Paulo Olimpio Gomes de Souza e Fabricio Dreyer de Avila Pozzebon Advogados Associados, que atua no processo criminal, o empresário foi condenado a dois anos e quatro meses de prisão – pena que foi convertida em prestação de serviço à comunidade e pagamento de prestação pecuniária. Já foi apresentado recurso.
“Ao aderir ao programa e pagar os tributos, consequentemente, deve ser reconhecida a extinção da sua punibilidade na esfera penal”, afirma Keunecke. “E se ele estivesse preso, deveria ser colocado em liberdade.” O advogado baseia-se no artigo 61 do Código de Processo Penal, segundo o qual em qualquer fase do processo o juiz pode, se reconhecer extinta a punibilidade, declará-la de ofício.
Com a liminar, o escritório avalia em quais casos de outros clientes poderia ser aplicada a tese. “Uma decisão como essa possibilita que todos os condenados pelos crimes citados na Lei da Repatriação, em primeira ou segunda instância, desde que não transitada em julgado a decisão, possam aderir ao regime especial e ter extinta sua punibilidade”, diz Keunecke.
Para Celso Vilardi, especialista em direito penal, a liminar é relevante e a primeira nesse sentido da qual se tem notícia. “Por temer exposição, muitos ainda não tiveram a iniciativa de entrar com ação na Justiça. Mas o texto da lei é tão ruim, com falhas absurdas como a restrição para quem atua em cargo público, que muitos só conseguirão resposta no Judiciário”, afirma.
Vilardi também defende que o princípio da inocência prevalece mesmo com condenação em segunda instância, não transitada em julgado. Essa dúvida surgiu entre várias pessoas após o Supremo Tribunal Federal (STF), em fevereiro, ter decidido que bastava decisão de segundo grau para a execução provisória de uma pena.
Para quem já foi condenado na esfera penal, a liminar é uma boa solução, segundo o tributarista Eduardo Salusse. Ele considera discriminatória qualquer restrição imposta não ao fato (crime), mas à pessoa (condenação). “No pior dos casos, se a liminar cair, ele apenas voltará ao cenário anterior. Mas há argumentos jurídicos sólidos para sair vitorioso.”

Fonte: Blog Tributo e Direito – 04/07/2016.

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