Mesmo que sejam frequentes as tentativas de obrigar sócios e administradores a responder com o patrimônio particular por dívidas de empresas, o Judiciário tem negado os pedidos sempre que não existe prova de ato ilícito.

Na área fiscal, o tributarista e sócio do Villarreal Advogados, Gabriel Villarreal, explica que se o problema é apenas a inadimplência, e não sonegação, sócios e gestores ficam protegidos.

“Discutiu-se no passado, se o não pagamento de tributo era violação à lei”, conta o especialista. Mas de acordo com ele, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacificou entendimento de que a inadimplência não era prática que pudesse subsidiar ataque aos bens de pessoas físicas ligadas à empresa.

No entanto, se há sonegação, a blindagem desaparece. “Sonegar é quando, por exemplo, a empresa que faturou R$ 100 mil declara apenas R$ 10 mil”, explica o tributarista. Segundo ele, mesmo a omissão de faturamento, que é o caso mais clássico e simples de sonegação, já é suficiente para fundamentar a responsabilização de sócios, administradores, empregados e prepostos.

Com a intensa informatização do fisco e o aumento no cruzamento de dados, o tributarista alerta que o fisco tem identificado sonegações com mais rapidez, e que os empresários precisam ficar atentos. “Há uma facilidade hoje no acesso à informação”, diz ele.

Nas discussões privadas, em âmbito cível, as diretrizes são parecidas. Para que o sócio ou gestor responda com seus bens pela dívida da empresa, é preciso que se identifique ato ilícito. Foi o que decidiu a 3ª Turma do STJ em março, num processo envolvendo as companhias aéreas Varig, Transbrasil e Interbrasil, bem como do fundo de previdência Instituto Aerus, todos falidos.

Originalmente, a ação movida pelo Ministério Público do Rio de Janeiro buscava apreender os bens de 159 administradores das quatro empresas.

Na ação julgada pelo STJ, envolvendo cinco dos réus, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino afirmou que os gestores só podem ser chamados a indenizar danos de terceiros quando suas ações ultrapassam os atos regulares definidos em contrato social ou estatuto, violam a lei, ou quando a ação é feita com culpa ou dolo. “Só insucesso do empreendimento mercantil não remete à responsabilização”, disse ele.

O sócio da área cível do Andrade Maia Advogados, Fábio Cardoso Machado, conta que as tentativas de responsabilização não apenas de administradores, como no caso do STJ, mas também dos sócios das empresas são vistas com muita frequência. Ele alerta, porém, que se de um lado a jurisprudência está firmada no sentido garantir a proteção dos gestores, de outro, a blindagem pode cair se forem encontrados problemas de governança.

Em outras palavras, Machado diz que a responsabilização é uma possibilidade sempre que ocorre o descumprimento de uma regra legal ou contratual. Seria o caso de uma empresa que se dedica a atividade não prevista em contrato social, ou mesmo a situação em que os sócios de uma empresa misturam bens pessoais com os bens da empresa. “Se o sócio usa dinheiro da sociedade para gasto pessoal, isso caracteriza confusão patrimonial. É uma irregularidade, um ato ilícito”, afirma o especialista.

A situação é bem diferente quando o gestor toma uma decisão ruim do ponto de vista dos negócios, mas sem infringir a legislação, explica Machado. Nesse caso, ele aponta que a blindagem aos bens das pessoas físicas permanece.

Roberto Dumke

 

Fonte: DCI – LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS – 03/05/2016.

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