O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) quer reduzir a ocorrência de um tipo de infração que tem gerado multas milionárias a empresas: o “gun jumping” – expressão em inglês que significa “queimar a largada”. A prática consiste no fechamento de um negócio (fusão ou aquisição) antes de sua aprovação pelo órgão regulador. Em caso de condenação, a multa para as partes envolvidas pode chegar a R$ 60 milhões.

Como o órgão antitruste verificou que nos casos analisados não houve má-fé, decidiu lançar um guia para orientar os empresários brasileiros. De acordo com o Cade, multas milionárias foram aplicadas porque houve descuido, má orientação ou porque simplesmente os envolvidos não sabiam que estavam errados.

As operações analisadas pelo órgão regulador não foram anuladas, mas as empresas foram penalizadas. Na aquisição de 40% da participação da Petrobras no Bloco BS-4, localizado na bacia de Santos, pela OGX, por exemplo, o acordo firmado com o Cade resultou em multa de R$ 3 milhões.

O guia informa, por exemplo, que antes da aprovação do negócio pelo Cade são proibidas cláusulas indicando integração prematura entre as empresas envolvidas ou qualquer atividade que exerça influência nos negócios da parte que será adquirida. Há também restrição quanto à troca de informações concorrencialmente sensíveis – como custos, capacidade de produção e estratégias comerciais.

O Cade reconhece que as partes precisam saber de dados dos envolvidos para examinar a viabilidade do negócio. Por isso, estabeleceu regras. Para operações complexas, por exemplo, sugere a adoção de um protocolo antitruste para evitar que administradores, funcionários ou representantes de uma empresa tenham acesso às informações sensíveis da outra parte até o fechamento da operação.

A prática de “gun jumping” surgiu com a atual lei de defesa da concorrência – Lei nº 12.529, de 2012, que obriga a notificação prévia de fusões e aquisições. Pela norma antiga, as companhias tinham permissão para primeiro concluir a operação e depois submetê-la ao Cade. “Percebemos a necessidade de garantir segurança jurídica às empresas sobre o momento anterior à notificação”, diz o presidente do Cade, Vinicius Marques de Carvalho.

A lei apresenta o “gun jumping” no parágrafo 4º, inciso 2º, do artigo 88. Segundo o dispositivo, as empresas que fecharem negócio sem a aprovação final do Cade estarão sujeitas a multa de até R$ 60 milhões e processo administrativo para anular a operação. Mas a norma não define o que são condutas irregulares.

O caso OGX-Petrobras foi o primeiro a ser analisado pelo Cade, em julho de 2013. Os conselheiros decidiram manter a operação porque o “gun jumping” foi caracterizado por atos “meramente administrativos”. O negócio não havia gerado efeito anticoncorrencial e seu objeto ainda não estava em funcionamento. A multa de R$ 3 milhões foi, até agora, a maior punição no país.

Depois foram registrados mais dois casos sobre concessão de bacias de petróleo. Ambos com a empresa UTC Óleo e Gás – um envolvia a Potióleo e o outro a Aurizônia Petróleo. Segundo o presidente do Cade, esses três primeiros casos tiveram o mesmo pano de fundo: as empresas disseram acreditar que a operação não precisava ser notificada ao Cade porque havia orientação da Agência Nacional de Petróleo (ANP) sobre o assunto.

“Quando as empresas perceberam que deveria ser feita a notificação, a operação já havia sido consumada”, afirma Carvalho. “Mas elas não agiram de má-fé.”

Os outros dois casos ocorreram em 2014 e em abril deste ano. O primeiro envolvia uma operação entre a Fiat e a Chrysler. O outra era sobre a compra da Brasfigro, dona das marcas de enlatados Jurema, Jussara e Tomatino, pela Goiás Verde.

Agora, com o guia, as empresas passam a ter parâmetros de referência, segundo a advogada Patricia Avigni, do Grinberg e Cordovil Advogados. “Está mais claro como as empresas devem agir. O que se espera agora é que diminuam os casos de gun jumping ou não se registre mais nenhum”, afirma.

Até a publicação do guia, advogados orientavam-se pelas poucas informações divulgadas sobre os casos analisados pelo Cade. Segundo a advogada Priscila Brolio Gonçalves, do escritório VPBG, só quem acompanhava um processo sabia, por exemplo, como a penalidade foi calculada e como configurou-se o “gun jumping”.

O guia traz ainda informações sobre pagamento, o que era uma das dúvidas comuns das empresas, segundo Priscila. O Cade esclareceu que, antes de sua decisão, não pode ser feito o pagamento integral. É permitido apenas um sinal – o guia não determina quanto – ou o depósito da quantia total em uma conta que só poderá ser acessada pela parte depois da aprovação do órgão.

Fonte: VALOR ECONÔMICO – LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS – De São Paulo 22. 06. 2015

 

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