O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) reabre suas portas hoje ainda sem condições de julgar processos. Falta escolher cerca de 20 conselheiros e não há recursos para pagar os julgadores. O órgão não realiza sessões de julgamento há quatro meses, desde que foi deflagrada a Operação Zelotes, que investiga um esquema de corrupção no órgão.

Hoje será realizada uma cerimônia para comemorar o retorno das atividades, com a presença do ministro Joaquim Levy. Porém, o presidente do Carf, Carlos Alberto Barreto, não arrisca uma data para a retomada dos julgamentos. “Acreditamos que a partir da segunda semana de agosto teremos condições de funcionar”, diz Barreto, acrescentando que o órgão não ficou parado. “Nunca trabalhei tanto como nesses quatro meses.”

De acordo com Barreto, foi feito “um grande esforço” para formalizar processos e dar andamento a casos que estavam parados à espera de redação final de decisão ou análise para verificar se poderiam ser enviados à Câmara Superior de Recursos Fiscais. São processos que envolvem R$ 105 bilhões em execuções fiscais.

Sem os julgamentos, a estimativa é de que 8.160 processos se acumularam, que somariam cerca de R$ 35 bilhões. O cálculo foi feito pelo escritório Amaral, Yazbek Advogados, a pedido do Valor. Levou-se em consideração a média mensal de julgamentos e valores envolvidos.

Para a retomada dos julgamentos, o conselho ainda precisa resolver como serão feitos os pagamentos a seus integrantes. Uma das mudanças após a deflagração da Operação Zelotes foi a fixação de uma remuneração de R$ 1.872,50 por sessão para os conselheiros que representam os contribuintes. No entanto, é necessária previsão orçamentária e a análise do projeto de lei sobre o assunto ficou suspensa pelo recesso parlamentar. Se o projeto de lei não for aprovado, uma saída seria a edição de medida provisória.

Também faltam definir nomes para cerca de 20 vagas de representantes de contribuintes, o que deve ser feito na próxima semana, de acordo com Barreto. A rigor, o conselho pode iniciar os julgamentos sem a composição completa, com um número mínimo de conselheiros que garanta a paridade, segundo Barreto. Mas a intenção é de retomá-los somente com o total de 120 integrantes.

Os julgamentos também não serão retomadas com força total por causa da nova composição. “Haverá um período de adaptação [dos novos conselheiros], que não deve ser curto”, afirma Cristiane Romano, do Machado Meyer. De acordo com a advogada, muitos conselheiros novos ainda terão que se ambientar com o conselho, que deve ter um começo mais lento.

Para Ana Cláudia Utumi, sócia responsável pela área tributária do TozziniFreire Advogados, seria positivo que os casos de maior relevância fossem pautados daqui a algum tempo. “Vejo com preocupação o retorno imediato dos julgamentos”, diz. Para a advogada, se, por um lado, a limitação de dois pedidos de vista dá agilidade aos processos, ela também diminui o tempo para análise do caso e discussão.

A pauta de julgamentos das primeiras sessões ainda não foi divulgada, mas deve seguir a programação anterior à interrupção dos julgamentos, exceto nos casos em que o relator afastou-se do órgão. De acordo com Barreto, um dos temas importantes que deverá ser enfrentado é a tributação de juros sobre capital próprio.

De acordo com o presidente, os temas que vão voltar primeiro a julgamento são aqueles que já estavam sorteados e já estavam na pauta, seguindo os critérios de prioridade de julgamento. Têm preferência no órgão as discussões que envolvem idosos, pessoas com problemas sérios de saúde, mais de R$ 15 milhões e pessoas processadas criminalmente (representação penal). Esses processos são conhecidos internamente como “capa vermelha”.

Os processos suspeitos de terem sido envolvidos em tráfico de influência ou relacionados a práticas de corrupção no Carf entrarão nessa lista, segundo Barreto. “Serão tratados com absoluta prioridade. Entrarão aqui com duas tarjas vermelhas”, afirma. Ao todo, há 70 casos nessa condição, que envolvem cerca de R$ 19 bilhões.

Segundo o presidente do Carf, cada caso em que foi apontada fraude será analisado “sob a perspectiva da nulidade”. Se houver comprovação de fraude, o julgamento será refeito. Nos processos em que o julgamento levou à formação de jurisprudência, o Carf terá que fazer uma nova análise. Se o caso suspeito abriu uma divergência dentro do conselho para permitir que a tese a favor das empresas fosse levada para a Câmara Superior de Recursos Fiscais, o julgamento terá que ser refeito.

Para Barreto, o importante é haver eficiência com a retomada do órgão. “A orientação do ministro [Levy] é para a volta da normalidade de funcionamento. Mais do que isso: o Carf deve ter retomada a sua efetividade no julgamento.” O estoque das causas que estão em julgamento no conselho chega a R$ 550 bilhões.

 

Fonte: Beatriz Olivon e Juliano Basile – De Brasília – 28/07/2015

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