Em meio à queda da arrecadação de ICMS do Estado de São Paulo, os agentes do Fisco paulista querem evitar que o governador Geraldo Alckmin (PSDB) prorrogue um benefício fiscal concedido a frigoríficos. Na prática, a medida permite que o setor aproveite créditos acumulados de ICMS mesmo que essas companhias tenham débitos inscritos na dívida ativa do Estado.
O alvo da divergência é o Decreto nº 57.686, de 28 de dezembro de 2011 e renovado anualmente desde então. Como o decreto expira em 31 de março, o Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo (Sinafresp) busca barrar a prorrogação. A Secretaria de Fazenda informa que “o assunto está em fase de estudos”.
Em ofício enviado ao governador em 26 de fevereiro, a entidade avalia que o decreto “afeta nocivamente a justiça fiscal” e diz que o benefício fiscal coloca por terra o esforço de fiscalização e autuação. Segundo o Sinafresp, há empresas do setor frigorífico que se valem de benefícios fiscais irregulares concedidos por outros Estados e que são “sistematicamente autuadas”.
Com o decreto, porém, as empresas autuadas podem usar os créditos acumulados de ICMS – gerados na compra de gado bovino em outros Estados, por exemplo – ainda que tenham débitos com o Fisco, o que não é permitido a outros segmentos. No ofício ao governador, o sindicato cita o regulamento do ICMS, que veda a prática – os frigoríficos são exceção, por força do Decreto 57.686.
Considerando apenas os principais frigoríficos brasileiros – JBS, Marfrig e Minerva -, os débitos de ICMS já inscritos na dívida ativa da do Estado de São Paulo somam cerca de R$ 800 milhões, de acordo com dados disponíveis no site da secretaria. Dentre os frigoríficos, a Marfrig registra R$ 591,9 milhões em autuações de ICMS inscritos na dívida ativa. Por sua vez, os débitos da JBS totalizam R$ 164 milhões, e os da Minerva, R$ 53,6 milhões. Procuradas, as três companhias não quiseram comentar a questão.
Na avaliação da sócia da área tributária do Machado Meyer Advogados, Fernanda Sá Freire, a exceção aos frigoríficos tem razão de ser. De acordo com ela, o setor recebe autuações milionárias de ICMS pela disputa entre Estados no âmbito da guerra fiscal. Um fato recorrente, acrescenta, é a concessão de benefícios irregulares, não aprovados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) – por parte de Estados do Centro-Oeste.
Nesses casos, o problema é que o produtor que vendeu o gado bovino e pagou ICMS reduzido – 3% em vez de 12%, por exemplo – emite nota fiscal ao frigorífico com o ICMS integral, o que dá direito ao crédito acumulado de 12% para a empresa de carne. É exatamente nessas situações que os fiscais lavram as autuações, argumentando que o crédito deve ser o percentual que foi efetivamente pago, e não aquele da nota fiscal.
Segundo Fernanda, há precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF) favoráveis aos frigoríficos. A argumentação é que os contribuintes não podem ser penalizados por disputa entre os Estados.
Na mesma linha, o sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia, Marcelo Salomão, diz que as decisões favoráveis aos contribuintes reforçam a necessidade do decreto, tendo em vista que as autuações poderão ser canceladas. “[O decreto] é até uma sinalização do Estado dizendo que pode perder todas essas autuações”, diz.
Fonte: Notícias Fiscais – 21/03/2016.